A Internet das Coisas a Serviço das Pessoas

A Internet das Coisas

Não consigo imaginar nenhum outro momento histórico em que as expectativas acerca do futuro tenham se entremeado tanto no tempo presente. Não vivemos uma mera sensação difusa de progresso; temos a certeza de que uma verdadeira revolução nos espera logo à frente. Uma revolução tecnológica em sua base, mas, em última instância, uma transformação radical de nossas formas de vida.

O avanço de tecnologias, em especial as digitais, irá afetar profundamente todas as estruturas econômicas e sociais. Inteligência artificial, robótica avançada, data science, fintechs e outras vertentes desse fenômeno vão deixando o status de promessas para se incorporar discretamente em nosso dia a dia.

Talvez a mais impactante e pervasiva dessas tecnologias digitais seja a internet das coisas, objeto de atenção prioritária de governos e da iniciativa privada pelo mundo inteiro. Com certeza, o leitor já deve ter se deparado com o exemplo batido da “geladeira do futuro”, que vai detectar que o leite acabou e o incluir como item na lista de compras da semana. Bem, esqueça isso. Internet das coisas é muito mais que uma geladeira conectada. É a progressiva automatização de setores inteiros da economia e da vida social com base na comunicação máquina-máquina: logística, agricultura, transporte de pessoas, saúde, produção industrial e muitos outros. Para isso, é necessário um ambiente favorável ao acesso de um número cada vez maior de dispositivos.

Nas últimas décadas, bilhões de pessoas se conectaram ao mundo digital. Dados recentes da União Internacional de Telecomunicações (UIT) mostram que 95% da população global já vivem em áreas cobertas com rede celular (2G ou mais) e 84% têm acesso à banda larga móvel. Soma-se a isso o rápido crescimento das redes 4G, tecnologia já acessível para 4 bilhões de pessoas.

Contudo, há ainda um longo caminho pela frente: metade da população mundial permanece sem acesso à internet banda larga, segundo a UIT. No Brasil, a proporção se repete: 50% dos lares não têm acesso à internet, de acordo com a pesquisa TIC Domicílios. Os números têm diminuído gradualmente, mas a democratização no acesso à internet é um passo necessário para alcançarmos uma rede verdadeiramente global. As dificuldades, no entanto, não turvam o horizonte promissor das tecnologias digitais.

A velocidade das transformações decorrentes do desenvolvimento da IoT é um tema em discussão, mas parece haver um acordo sobre sua enorme intensidade. Por isso, acredito que o livro do professor Eduardo Magrani sobre o tema, primeiro do gênero no país, vem no momento certo.

Um requisito fundamental para o futuro da internet das coisas é que sua expansão não seja realizada em detrimento da segurança e da privacidade das pessoas. Os recentes e massivos ataques distribuídos de negação de serviço (conhecidos pela sigla DDoS, da expressão em inglês distributed denial of service) popularizam uma frase que serve como epígrafe a um dos capítulos deste livro: “A internet foi projetada para resistir a uma explosão nuclear. Mas não a um ataque de torradeiras”.

O fato de esses ataques tirarem do ar temporariamente um site do governo ou uma plataforma de comércio eletrônico já é motivo de forte preocupação. Mas, quando todo o trânsito, a rede elétrica, instalações de saúde e outras áreas vitais de uma sociedade estiverem conectados, essa preocupação passará para outro nível.

Há ainda o enorme desafio de garantir a privacidade dos indivíduos em uma sociedade hiperconectada. Segundo um estudo da Cisco, teremos algo em torno de 50 bilhões de dispositivos conectados no ano (não tão distante) de 2020. Eles estarão em todos os lugares, inclusive em nosso corpo — os wearables são dispositivos conectados, como relógios, sapatos e outras peças de vestuário. Juntos, todos esses terminais irão coletar uma quantidade assombrosa de dados pessoais.

Para trabalhar com um número mais preciso, um estudo da Telefônica estima que a capacidade global de armazenamento e processamento de dados será de 800 exabytes em 2020. Para fins de comparação, em 2015 era de 80 exabytes. A maior parte desses dados coletados e tratados será composta de dados relacionados a pessoas identificadas ou identificáveis, portanto dados pessoais.

Boa parte das empresas de aplicações da internet das coisas adota ou adotará modelos de negócio em que fração significativa dos resultados dependerá da monetização de dados pessoais, de maneira similar ao que já acontece com as aplicações da internet tradicional. São modelos de negócios legítimos, cuja sustentabilidade depende, no entanto, de um respeito claro à privacidade dos usuários.

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