EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Princípios e Diretrizes do Sistema Único de Saúde - SUS
Desde a VIII Conferência Nacional de Saúde (1986) e a Constituinte (1987 a 1988), um alto grau de consenso político veio a constituir o fator decisivo para a conformação federativa do SUS. Tal consenso defendeu três teses convergentes:
- gestão compartilhada nos âmbitos federal, estadual e municipal, com direção única em cada esfera de governo;
- descentralização que concede papel destacado à gestão municipal;
- funcionamento obrigatório do controle social, por meio dos conselhos de saúde.
Tais vetores ensejaram o estabelecimento de princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), que constituem as bases para o funcionamento e organização do sistema no país.
Universalização
Saúde é direito de cidadania e dever do Governo: municipal, estadual e federal. Com a universalidade, o indivíduo passa a ter direito de acesso a todos os serviços públicos de saúde, assim como àqueles contratados pelo poder público, independentemente de sexo, raça, renda, ocupação, ou outras características sociais ou pessoais. É a garantia de atenção à saúde por parte do sistema, a todo e qualquer cidadão.
Equidade
É um princípio de justiça social porque busca diminuir desigualdades. Isto significa tratar desigualmente os desiguais, investindo mais onde a carência é maior. Apesar de todos terem direito aos serviços, as pessoas não são iguais e, por isso, têm necessidades diferentes. Portanto, pela equidade investe-se mais onde a carência é maior. Para isso, a rede de serviços deve estar atenta às necessidades reais da população a ser atendida.
Integralidade
É a garantia do fornecimento de um conjunto articulado e contínuo de ações e serviços preventivos, curativos e coletivos, exigidos em cada caso para todos os níveis de complexidade de assistência. Portanto, significa considerar a pessoa como um todo, atendendo a todas as suas necessidades. Para isso, é importante a integração de ações, incluindo a promoção da saúde, a prevenção de doenças, o tratamento e a reabilitação.
Ao mesmo tempo, o princípio da integralidade pressupõe a articulação da saúde com outras políticas públicas, como forma de assegurar uma atuação intersetorial entre as diferentes áreas que tenham repercussão na saúde e qualidade de vida dos indivíduos.
Hierarquização e da Regionalização
A hierarquização deve, além de proceder à divisão de níveis de atenção, garantir formas de acesso a serviços que componham toda a complexidade requerida para o caso, no limite dos recursos disponíveis numa dada região. Deve ainda incorporar-se à rotina do acompanhamento dos serviços, com fluxos de encaminhamento (referência) e de retorno de informações do nível básico do serviço (contra-referência).
Por isso, os serviços devem ser organizados em níveis de complexidade tecnológica crescente, circunscritos a uma área geográfica delimitada, planejados a partir de critérios epidemiológicos e com a definição e o conhecimento da clientela a ser atendida.
O acesso da população à rede deve se dar através dos serviços de nível primário de atenção que devem estar qualificados para atender e resolver os principais problemas que demandam os serviços de saúde; devendo, os demais, serem referenciados para os serviços de maior complexidade tecnológica.
Descentralização e Comando Único
Descentralizar é redistribuir poder e responsabilidades entre os três níveis de governo. Na saúde, a descentralização tem como objetivo prestar serviços com maior qualidade e garantir o controle e a fiscalização pelos cidadãos. Quanto mais perto estiver a decisão, maior a chance de acerto. No SUS a responsabilidade pela saúde deve ser
descentralizada até o município. Isto significa dotar o município de condições gerenciais, técnicas, administrativas e financeiras para exercer esta função. A decisão deve ser de quem executa, que deve ser o que está mais perto do problema. A descentralização, ou municipalização, é uma forma de aproximar o cidadão das decisões do setor e significa a responsabilização do município pela saúde de seus cidadãos. É também uma forma de intervir na qualidade dos serviços prestados.
Para fazer valer o princípio da descentralização, existe a concepção constitucional do mando único. Cada esfera de governo é autônoma e soberana nas suas decisões e atividades, respeitando os princípios gerais e a participação da sociedade. Assim, a autoridade sanitária do SUS é exercida na União pelo ministro da saúde, nos estados pelos secretários estaduais de saúde e nos municípios pelos secretários ou chefes de departamentos de saúde. Eles são também conhecidos como “gestores” do sistema de saúde.
Participação Popular
Parte do pressuposto de que a participação da sociedade não deve se esgotar nas discussões que deram origem ao SUS. Como forma de garantir a efetividade das políticas públicas de saúde, bem como forma de exercício do controle social, devem ser criados canais de participação popular na gestão do SUS em todas as esferas.
São iniciativas voltadas à promoção dessa participação a criação dos Conselhos17 e das Conferências18 de Saúde, que têm como função formular estratégias, controlar e avaliar a execução da política de saúde.
Resolubilidade (Solução de Problemas)
É a exigência de que, quando um indivíduo busca o atendimento ou quando surge um problema de impacto coletivo sobre a saúde, o serviço correspondente esteja capacitado para enfrentá-lo e resolvê-lo até o nível da sua competência.
Marco Legal do SUS
A criação do SUS, feita pela Constituição Federal, foi posteriormente implementada por meio da Lei no 8.080, de 1990 (Lei Orgânica da Saúde19) e da Lei no 8.142, de 1990 (Regula as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde20). Estas leis definem as atribuições dos diferentes níveis de governo com a saúde;
Estabelecem responsabilidades nas áreas de vigilância sanitária, epidemiológica e saúde do trabalhador; regulamentam o financiamento e os espaços de participação popular; formalizam o entendimento da saúde como área de “relevância pública” e a relação do poder público com as entidades privadas com base nas normas do direito público; dentre outros vários princípios fundamentais do SUS.
Também foram editadas diversas normas e portarias pelo Ministério da Saúde – as Normas Operacionais Básicas (NOBs) - como instrumentos de regulamentação do sistema. Tais normas definem a forma de transferência de recursos entre governos e as modalidades de pagamento dos serviços de saúde, além de instruírem o processo de descentralização e de construção de uma rede de serviços capaz de operar com racionalidade sistêmica.
Portanto, o SUS conforma modelo público de prestação de serviços e ações de saúde em âmbito nacional, incorporando novos instrumentos gerenciais, técnicos e de democratização da gestão. Em sua concepção original, visa integrar os subsistemas de saúde pública e de assistência previdenciária - os ramos da medicina preventiva e curativa -, bem como os serviços públicos e privados, em regime de contrato ou convênio, num sistema único e nacional, de acesso universal e igualitário, organizado de forma regionalizada e hierarquizada, sob comando único em cada nível de governo, segundo as diretrizes da descentralização administrativa e operacional, do atendimento integral à saúde e da participação da comunidade visando ao controle social.
Este modelo envolve inúmeras variáveis e só se concretiza por meio do estabelecimento de relações interinstitucionais de governo. A descentralização, associada à diretriz da gestão única, resulta em três arranjos formais para o sistema de saúde: municipais, estaduais e o nacional. No entanto, a integralidade e a hierarquização induzem à formação de outros subsistemas, como consequência da negociação intergestores. Como se percebe, o SUS é fruto de acordos políticos e do desenvolvimento de instrumentos técnico-operacionais necessários à integração do Sistema.
Em linhas gerais, essa distribuição intergovernamental de funções delegou à União o financiamento e a formulação da política nacional de saúde, além da coordenação das ações intergovernamentais. Tal situação é evidenciada no art. 1621 da Lei no 8.080 de 1990.
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